segunda-feira, 13 de outubro de 2014

Um homem. Uma mulher. Um elevador




Na espera. Moça atraente, cabelo escuro, preso, sendo duas mechas deixadas ao lado do rosto, bolsa clara, grande, brincos discretos, mas brilhantes. O celular sendo mexido em uma das mãos. 30 anos, aparenta.
Porta do elevador aberta.
Ela se vê no espelho grande que ocupa o fundo do recinto. Engravatado, homem atraente, cabelo castanho, penteado para trás, levemente grisalho, mas ele deve ter só uns 35. Ele segura um jornal, pedaço grande, dobrado de forma circular.
O homem segura a porta ao ver que a mulher demora a entrar, distraída com o celular.
_ Bom dia – cumprimenta, sorriso discreto, criando expectativas, sem dar importância ao risco que isso representa. Não é a primeira vez que ele a vê, já tinha observado passar no hall algumas vezes.
A mulher acena com a cabeça, parece que o dia dele está começando bem. Mas não olha nos olhos do moço. Coitado, ele esperou tanto por esse momento de proximidade.
_ Solteira. Meu status mudou – aperta sem olhar o botão do térreo.
O homem, pego de surpresa, fica sem reação. Reage:
_ Prazer, sou Ricardo Rangel – quase estica um dos braços, mas desiste logo no começo, percebendo que a moça não olha nem um pouco pra ele. Continua mexendo em sabe lá o quê naquele aparelho eletrônico.
_ Nome de perfil: Maggie Barbie. Nome original é Margareth Barbosa. Antiquado. Momento de reconfiguração. Bateria precisando ser recarregada.
_ Você precisa de um carregador... Maggie?
_ Não, um sanduiche me recarrega. O GPS já está me indicando um restaurante por aqui.
_ Tem um ali à esquina. É que eu só almoço lá. Sou de Minas. Uma cidadezinha pequena. Não tem nem 10 mil habitantes.
_ Cidade natal: Rio de Janeiro. Cidade atual: Rio de Janeiro. Tenho 25 mil amigos.
_ Popular você, hein? – soou surpreso, disfarçando com ironia. – Então, Maggie, você poderia almoçar comigo...
_ Estou sincronizando nossos perfis. Vendo compatibilidades. Achei seu nome pelo Bluetooth.
Surpreso, ele diz, um sorriso discreto:
_ Rápida, você, né?
_ Já fiz meu pedido. Foto do prato postada.
_ Minha nossa... Mas você ainda nem comeu.
_ Atualizações frequentes fazem parte do novo programa. Programa, você tem?
_ Programa?! O que... Você...
_ Hum... Serviço indisponível! – quase gritou, agitada de uma forma inesperada.
_ Hã? O quê?
_ Ou seria status off-line? – soltou mais uma.
_ Você está bem? – em pensamento imaginava coisas como: Bebeu? Usou drogas? Louca? Dia ruim?...
_ Acho que vai ser logout mesmo.
Ricardo nada falou desta vez. Passou uma das mãos pelos fios que caiam sobre sua testa. Sentia-se mais confuso do que na primeira vez que pisara na cidade grande.
            O elevador chega ao andar desejado por ambos. Abre.
_ Até mais, usuário! Bye, man! – a moça caminha apressadamente, continuando distraída a mexer no item que não se afasta. – Estará na próxima sessão?
_ Não. Quero dizer, não sei.
O recepcionista do prédio é a primeira pessoa a quem Ricardo pode recorrer após o instante passado.
_ Moça esquisita, meu caro. Acho melhor eu voltar a falar com minha namoradinha do interior. Essas meninas da cidade estão vivendo em outro planeta.
_ Ih... Eu me casei há cinquenta anos. E agora que você percebeu que os homens e as mulheres são de mundos diferentes, rapaz?