Na
espera. Moça atraente, cabelo escuro, preso, sendo duas mechas deixadas ao lado
do rosto, bolsa clara, grande, brincos discretos, mas brilhantes. O celular
sendo mexido em uma das mãos. 30 anos, aparenta.
Porta
do elevador aberta.
Ela
se vê no espelho grande que ocupa o fundo do recinto. Engravatado, homem
atraente, cabelo castanho, penteado para trás, levemente grisalho, mas ele deve
ter só uns 35. Ele segura um jornal, pedaço grande, dobrado de forma circular.
O
homem segura a porta ao ver que a mulher demora a entrar, distraída com o
celular.
_
Bom dia – cumprimenta, sorriso discreto, criando expectativas, sem dar
importância ao risco que isso representa. Não é a primeira vez que ele a vê, já
tinha observado passar no hall algumas vezes.
A
mulher acena com a cabeça, parece que o dia dele está começando bem. Mas não
olha nos olhos do moço. Coitado, ele esperou tanto por esse momento de
proximidade.
_ Solteira.
Meu status mudou – aperta sem olhar o botão do térreo.
O
homem, pego de surpresa, fica sem reação. Reage:
_
Prazer, sou Ricardo Rangel – quase estica um dos braços, mas desiste logo no
começo, percebendo que a moça não olha nem um pouco pra ele. Continua mexendo
em sabe lá o quê naquele aparelho eletrônico.
_ Nome de perfil: Maggie Barbie. Nome
original é Margareth Barbosa. Antiquado. Momento de reconfiguração. Bateria
precisando ser recarregada.
_
Você precisa de um carregador... Maggie?
_
Não, um sanduiche me recarrega. O GPS já está me indicando um restaurante por
aqui.
_ Tem
um ali à esquina. É que eu só almoço lá. Sou de Minas. Uma cidadezinha pequena.
Não tem nem 10 mil habitantes.
_ Cidade
natal: Rio de Janeiro. Cidade atual: Rio de Janeiro. Tenho 25 mil amigos.
_
Popular você, hein? – soou surpreso, disfarçando com ironia. – Então, Maggie,
você poderia almoçar comigo...
_
Estou sincronizando nossos perfis. Vendo compatibilidades. Achei seu nome pelo Bluetooth.
Surpreso,
ele diz, um sorriso discreto:
_
Rápida, você, né?
_ Já
fiz meu pedido. Foto do prato postada.
_ Minha
nossa... Mas você ainda nem comeu.
_
Atualizações frequentes fazem parte do novo programa. Programa, você tem?
_
Programa?! O que... Você...
_
Hum... Serviço indisponível! – quase gritou, agitada de uma forma inesperada.
_ Hã?
O quê?
_ Ou
seria status off-line? – soltou mais uma.
_
Você está bem? – em pensamento imaginava coisas como: Bebeu? Usou drogas?
Louca? Dia ruim?...
_
Acho que vai ser logout mesmo.
Ricardo
nada falou desta vez. Passou uma das mãos pelos fios que caiam sobre sua testa.
Sentia-se mais confuso do que na primeira vez que pisara na cidade grande.
O elevador chega ao andar desejado por ambos. Abre.
_
Até mais, usuário! Bye, man! – a moça caminha apressadamente, continuando
distraída a mexer no item que não se afasta. – Estará na próxima sessão?
_
Não. Quero dizer, não sei.
O
recepcionista do prédio é a primeira pessoa a quem Ricardo pode recorrer após o
instante passado.
_
Moça esquisita, meu caro. Acho melhor eu voltar a falar com minha namoradinha
do interior. Essas meninas da cidade estão vivendo em outro planeta.
_ Ih...
Eu me casei há cinquenta anos. E agora que você percebeu que os homens e as
mulheres são de mundos diferentes, rapaz?